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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Livro: Receitas de Amor para Mulheres Tristes de Héctor Abad Faciolince

Comprei este livro em promoção na FNAC sem ter grandes expectativas. A capa chamou-me a atenção, o título ainda mais, e ao desfolha-lo percebi que eram pequenas crónicas sobre a vida que nele constavam, como se de um livro-blog se tratasse. A grande vantagem nestes livros de pequenos contos, ou pequenas crónicas, é que se não gostarmos de uma podemos facilmente avançar para a seguinte.

 

 

Este livro de Receitas de Amor para Mulheres Tristes contem sábios conselhos mascarados de receitas, para que nós mulheres, algo complicadas, possamos ver a vida com outros olhos, quando assim é possível. Mas como diz o autor em algumas situações, não há receitas milagrosas para a cura da alma e nem sempre funcionam à primeira, por vezes é necessário insistir.

 

Os temas do livro são diversos, desde o simples feitio da mulher, à traição, passando pela depressão e pela maternidade, tudo um pouco é abordado em curtos e simples textos, que tantas vezes lembram a poesia. No fundo é uma coletânea de prosa poética, como prova este pequeno excerto que já aqui partilhei.

 

Não há muito que eu possa dizer sobre este livro, apenas que gostei muito, que me revi tantas vezes, e que outras tantas olhei em volta para perceber se aquele texto teria sido escrito para mim, sem eu saber. Este não é um livro para ler, é para irmos lendo. Uma receita de cada vez para que as mesmas não se misturem na nossa cabeça e se emaranhem. 

 

Partilho uma das receitas convosco, para vos aguçar o apetite:

 

Mais tarde ou mais cedo, se é que esse dia não chegou já, hás-de sentir a tremenda desolação da vida a dois. Ele não te vê. De repente dás contigo convertida num ser invisível: qualquer coisa nos olhos dele te faz desaparecer. Para esta solidão em companhia não resulta fazer barulho, o pranto não produz efeito, nem o riso. É uma cruel surpresa uma mulher descobrir que vive com um cego surdo-mudo que, porém, vê, isso sim, o ecrã da televisão, vê o cotão nos cantos da casa, as marcas dos dedos em todos os vidros, ouve o toque do telefone, faz negócios em voz alta pelo bucal.

 

Para este mal agudo dizem algumas optimistas que existe uma solução na cozinha. E sugerem a seguinte receita capaz de alterar os ânimos:

 

Conseguir seis perdizes desossadas (perdiz tão bela que nos leva a dizer Por Deus!). Lavá-las bem, muito bem, e começar por temperá-las com sal e pimenta. Dourá-las em manteiga misturada com azeite; juntar-lhes depois uns punhados de ervas aromáticas e umas colheres de natas. Vão depois ao forno médio até estarem bem cozinhadas. Servem-se com puré e bem quentes.

 

As perdizes são tão difíceis de obter nos nossos pequenos mercados que poucas vezes as minhas papilas conseguiram experimentar este esconjuro de feitiço contra a indiferença. Substitui as perdizes por galinhas-da-índia anãs e vê se com esta aldrabice a coisa sai bem. Mas quando um marido começa a ficar cego, o melhor é começares tu a ligar apenas àqueles que te veem.

de Héctor Abad Faciolince 

 

Este exemplo demonstra bem o que vocês poderão encontrar ao longo destas 125 páginas. São no fundo 125 páginas cheias de amor, de fraqueza, de medos e desilusões, temperadas com uma pitada de humor, auto-estima e ternura. Eu gostei muito, e serão textos a reler.

 

Alguém já leu este livro?

2 comentários

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    Mula 03.06.2017

    Gostei muito, só uma crónica ou outra mais aborrecida, mas identifiquei-me muito com o que li. 
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